FRAUDE EMPRESARIAL

18/09/2014 17:56

A História que narraremos a seguir, ocorreu no por volta do ano de 2002 aqui mesmo no Brasil, por motivos óbvios os nomes e lugares foram trocados, pois nossa intenção é relatar o MODUS OPERANTI, da quadrilha que foi desbaratada e demonstrar até onde podem chegar às mentes criminosas.

Manhã de uma segunda-feira quente do mês de Dezembro de 2002, aqui na capital paulista os termômetros ultrapassavam 30 graus, adentrávamos em uma Delegacia de Policia a fim de acompanhar um cliente em um caso comum de família, quando encontramos com o Delegado Chefe Aroldo, um grande amigo dos tempos policiais, que ao me encontrar abriu um enorme sorriso e me chamou para um cafezinho em sua sala, após os cumprimentos falou:

-Você continua trabalhando com a Empresa MAKBEQ (uma grande empresa multinacional do setor do comércio varejista)?

-Sim continuamos - respondi - aliás, você precisa de algo desta Empresa?

-Não, pelo contrário, pois há uns dias detivemos um “estelionatário” conhecido por inúmeros crimes e ele relatou que o Mário Xavier (meliante conhecido e admirado nos meios policiais por ter adquirido fortuna com os crimes de estelionato, contudo pela sua destreza nunca encontraram provas que o pudessem prendê-lo por muito tempo devido aos seus crimes), em uma conversa informal nos confidenciou que hoje havia centralizado seus negócios escusos no interior da Empresa MAKBEQ e dela estaria “ganhando muito dinheiro”, é lógico que disse em tom de brincadeira e não forneceu mais detalhes.

O Chefe Aroldo nos prevenia para que avisássemos a referida Empresa que poderia estar sendo alvo de operações criminosas.

Imediatamente ao sair daquela distrital fui ao escritorio central daquela grande Empresa e me reuni com o diretor de auditoria Sr João Batista – um executivo com imensa experiência em auditoria e prevenção de fraudes que após nos ouvir atentamente respondeu:

-Meu amigo, agradeço sua preocupação mais posso lhe assegurar que nossas operações financeiras, apesar de muito numerosas, são muito bem controladas e informações desta natureza nos chegam todos os dias através de e-mails e dos canais direto, basta uma desconfiança de um funcionário descontente com o chefe, contudo todas são averiguadas e afirmo ainda que quase nenhuma delas retratam a realidade.

Diante da resposta do amigo Diretor nos retiramos e prosseguimos com os nossos trabalhos.

Passados uns 30 dias, estávamos no inicio do ano de 2003 quando avançada a segunda quinzena fomos acionados por este mesmo diretor a fim de apurar uma fraude fiscal, na qual uma Empresa fornecedora de mão de obra emitiu nota de serviços com erro no ano da emissão e ao contatar a Empresa fornecedora descobriram que ela não existia e era fraude de um pagamento de R$15 mil.

Ao aceitarmos essa nova missão, começamos a investigar a fraude e para a nossa surpresa encontramos tantos outros pagamentos a outras empresas também inexistentes que durante uma extensa apuração chegou a cifra de R$850 mil em um ano e retroagindo a dois anos anteriores chegamos ao patamar de R$3,5 milhões de reais.

Foram três meses de intensas investigações que não se encaixavam a um único autor, descobrimos pelo menos 18 pessoas (entre funcionários e prestadores de serviço) divididas em seis grupos diferentes e não relacionados entre si.

Foi quando nos recordamos da conversa que tivemos com o chefe Aroldo e decidimos por iniciar outra investigação inversa, ou seja, investigaríamos o estelionatário conhecido como Mário Xavier, e investigando-o poderíamos descobrir a sua relação com as pessoas que compunham as seis quadrilhas já descobertas para sabermos como foi realizada tamanha fraude.

Ao investigarmos o Mário Xavier descobrimos que seu filho Tadeu frequentava uma faculdade de Direito e era colega de sala de um dos funcionários ligados há pelo menos três fraudes apuradas.

Começamos a investigar o Tadeu e a ouvir outras testemunhas na própria Empresa e não descobrimos nada que os ligasse a pessoa do estelionatário Mário Xavier.

Passaram-se mais três meses de investigação que consumiram mais de 160 horas de trabalho e um gasto de 30 mil reais em despesas e assim nos concentramos na pessoa do Tadeu pudemos liga-lo a um funcionário chamado Everton que abriu uma Empresa falsa em nome da própria esposa e a esta Empresa transferiu perto de vinte mil reais.

Em depoimento oficial o Everton contou que o Tadeu sob ordens do seu pai Mario, iniciou a Operação a questão e dois anos atrás mais como ele achava que “...meu pai estava muito velho e medroso..” decidiu aumentar a frequência das notas e assim aumentando o valor retirado.

Everton percebeu a facilidade e os contatos e decidiu agir por conta própria e foi surpreendido logo após o recebimento da primeira nota.

A partir destas informações seria apenas uma questão de tempo até prendermos o Tadeu, assim partimos em seu encalço e investigando seus relacionamentos o descobrimos em um Resort na cidade de Salvador-BA.

Imediatamente acompanhados dos policiais encarregados da investigação voamos para a capital baiana em uma sexta-feira de muito sol e calor, teríamos que encontra-lo antes dele ser informado pelos contatos paulistas, pois nele encontrava-se a chave para a conclusão deste crime.

Chegando ao Resort o encontramos no Bar, de frente ao mar, ele estava acompanhado de um Sr de aproximadamente 50 anos, grisalho e trajando um elegante e fino terno, que nos chamou a atenção pois contrastava com o ambiente, ao perceber nossa presença agiram como se já nos aguardassem e fomos de encontro a dupla.

Tadeu um rapaz de vinte e poucos anos alto e claro, cabelos na moda trajava camiseta e bermuda exibia um relógio Rolex autentico demonstrando seu alto poder aquisitivo portava-se de maneira preocupada, tentando mostrar descontração na presença de seu advogado o Dr Márcio, reconhecido e renomado advogado criminalista paulista.

Apresentamo-nos e os policiais efetuaram a prisão, baseados no mandado que já possuíamos, quando o Dr Márcio reconheceu o policial que nos acompanhava e após nosso pedido passou a esclarecer os detalhes do ocorrido, contanto que os fatos não fossem tomados a terno, visto que nossa intenção era ”desvendar” o “modo operante” dos criminosos sem neste momento nos preocuparmos com os desenlaces jurídicos e criminais.

Passou-nos a esclarecer:

-Na verdade eu aqui represento o Sr Mário Xávier que é pai do Tadeu, e olha que cobro muito caro por isso, - brincou sorrindo e prosseguiu com a narrativa:

-Meu cliente como todos vocês sabem é um Empresário que no passado envolveu-se em vários crimes de estelionato, e tem até certa fama por isso, contudo ao sentir a idade chegando resolveu “dar o último golpe” antes da aposentadoria e descobriu diante de algumas informações que a cerca de 3 anos atrás estavam por implantar funcionários terceirizados no departamento financeiro da então recém-incorporada MAKBEQ, imediatamente colocou 3 de seus pupilos infiltrados como funcionários desta empresa terceirizada de mão de obra, estes pupilos trabalharam nesta empresa por quase dois anos e pelo bom trabalho foram contratados efetivos pela MAKBEQ, durante todo este tempo o seu Mário investiu na formação destes pupilos pagando ajuda de custo e faculdade de ciências econômicas e a questão de dois anos já sabiam de todo o processo de pagamento das notas fiscais referentes a reformas e serviços de construção de todas as filiais, no sistema utilizado observaram que devido ao seu grande fluxo de pagamentos e serviços era quase que impossível conferirem a todos os pagamentos  e desenvolveram um sistema que falsificava as assinaturas dos dois diretores encarregados das autorizações e pulverizando entre empresas fantasmas e contas bancárias distintas movimentou cerca de quase quatro milhões de reais em três anos, só que..- completou fazendo uma pausa para um drink.

-A questão de uns 6 meses ele brigou com seu filho Tadeu que não estava satisfeito com a parte que seu pai lhe atribuía e optou por agir sozinho inserindo outras notas sem o conhecimento do seu pai, e o que ainda deixou de pagar os agentes infiltrados no departamento que por sua vez passaram a agir e abrir Empresas por sua conta e aplicar o desvio de forma independente o que acabou por facilitar a descoberta do sistema criminoso.

Foi exatamente por isso que nossas investigações nunca fechavam em um só criminoso, pois com a divisão da quadrilha as pistas levavam a muitas pessoas e culpados.

Quando voltamos procuramos a presidência da MAKBEQ que ao ter ciência do ocorrido pediu que encerrássemos nossas investigações e que deixássemos a situação criminal como estava a cargo da Policia, pois assim não precisariam voltar muito ao passado e nesta altura dos acontecimentos não queriam sua gestão manchada com tamanha fraude.

No caminho do aeroporto não pude deixar de dar uma paradinha na Lagoa dos Orixás e sentado num aconchegante banco de jardim sentir a energia do abençoado lugar e meditar o porquê de pessoas como o seu Mário, tão astuto e inteligente ter dedicado uma vida inteira ao crime e negligenciado a criação de seu único filho, agora sofrendo e vendo-o perecer sob a ganancia e a desventura das algemas do crime.

Assim caia a tarde de um dia de sol...

 

FIM ...